Primeiros passos:
São as seguintes as
informações disponíveis sobre o vírus H5N1 causador da gripe aviária: mais
de 200 milhões de aves (domésticas e migratórias) na Ásia, Oriente Médio,
Europa e África morreram em decorrência de infecção pelo vírus ou foram
mortas pelas autoridades na tentativa de conter a disseminação do vírus.
Desde 2003, houve 92 casos confirmados de pessoas mortas por causa da gripe
aviária, a maior parte delas na Ásia, cujo contágio se deu pelo contato com
as aves, segundo dados da Organização Mundial de Saúde. Pelo menos outras
170 foram infectadas. Desde o início de fevereiro de 2006, 13 países em três
continentes relataram as primeiras ocorrências da gripe aviária em pássaros.
Apesar da
contaminação cada vez maior observada em aves domésticas e selvagens, a OMS
destaca que a infecção de seres humanos pelo vírus continua rara.
.
Não existe ainda vacina contra
o vírus H5N1. Os Institutos Nacionais de Saúde anunciaram o começo de testes
clínicos no ano passado, os quais prosseguem ainda hoje. Estudos feitos em
laboratórios indicam que alguns dos remédios aprovados nos EUA para o
combate ao vírus da gripe humana podem funcionar no tratamento de seres
humanos infectados pela gripe aviária, segundo informações repassadas pelo
governo federal. Contudo, os vírus da gripe podem se tornar resistentes a
esses remédios, de tal modo que nem sempre eles funcionarão. O vírus H5N1 é
resistente à amantadine e à rimantadine, dois antivirais normalmente
utilizados em casos de gripe. Dois outros antivirais, oseltamivir e
zanamivir, podem proporcionar bons resultados no tratamento de gripe causada
pelo vírus H5N1. Contudo, será preciso realizar mais estudos para demonstrar
sua eficácia.
Mesmo que os cientistas consigam
desenvolver uma vacina, não há garantias de que haveria doses em número
suficiente, e prontas a tempo, uma vez que o processo de produção que
utiliza o método atual de cultivo do vírus em ovos de galinha levaria
talvez de seis meses a um ano, de acordo com
Neil Fishman, diretor do departamento
de epidemiologia e de controle de infecção da Escola de Medicina da
Univ. da Pensilvânia.
Seriam necessários milhões
de ovos só para atender os EUA, sem falar do resto do mundo, diz Fishman,
acrescentando que os cientistas desenvolveram novas tecnologias capazes
de acelerar a produção de vacinas, porém essas tecnologias ainda não
foram aprovadas pelo
FDA, a agência americana responsável
pela aprovação de alimentos e remédios no país.
Por enquanto, houve pelo
menos dois casos prováveis de transmissão do vírus de um ser humano para
outro, de acordo com Fishman. Ambos ocorreram no Sudeste Asiático e foram
investigados pelas autoridades da área de saúde em 2004 e 2005. Para que
ocorra uma pandemia, o vírus teria de evoluir para uma cepa que permitisse
facilmente sua transmissão de uma pessoa para outra ou de maneira eficiente,
para usar o termo clínico empregado por Fishman. Para que haja uma pandemia,
o contágio dos seres humanos teria de ocorrer de forma eficiente, o que
ainda não aconteceu, diz Fishman.
.
Os cientistas discordam sobre a possibilidade de uma pandemia. Há quem
analise os dados e conclua que o vírus, em ação desde 1997, não provocou
pandemia alguma, portanto não será agora que provocará, diz Fishman,
encarregado pela Universidade da Pensilvânia da formulação de um plano de
prontidão em caso de ocorrência da gripe. Outros examinam os mesmos dados e
concluem que a pandemia está próxima. O debate prossegue, e eu confesso que
não sei qual seria a resposta certa.
Houve três pandemias de
gripe no século 20. A gripe espanhola, de 1918 a 1919, matou entre 20 e
50 milhões de pessoas no mundo todo, sendo que nos EUA o número de
vítimas foi de 500.000. A gripe asiática, de 1957 a 1958, matou dois
milhões de pessoas no mundo todo, sendo 100.000 delas nos EUA. A gripe
de Hong Kong, de 1968 a 1969, ceifou um milhão de vidas no mundo todo
70.000 só nos EUA.
Gripe aviária, comitês de planejamento:
A possibilidade
de uma pandemia, ainda que incerta, fez com que empresas e especialistas em
gestão de risco refletissem demoradamente sobre as conseqüências da gripe
sobre os negócios. As empresas mais afetadas de qualquer indústria serão
provavelmente aquelas que atuam no mundo todo, com cadeias globais de
suprimentos e/ou clientes internacionais, informa um relatório publicado em
janeiro de 2006 pela consultoria Marsh, de Nova York. Já há governos
municipais, estaduais e nacionais pondo em prática planos para restringir
viagens, fechar escolas, colocar em quarentena indivíduos e comunidades e
proibir reuniões públicas. Essas medidas foram tomadas durante a epidemia de
SARS, sobretudo na Ásia, onde o impacto da doença foi maior.
.
O
relatório Marsh informa que muitas empresas, principalmente as grandes
multinacionais, instituíram comitês de combate à gripe aviária. Algumas
formaram forças-tarefa que unem o planejamento estratégico, procedimentos de
manutenção das operações, recursos humanos e serviços de saúde com o
objetivo de instituir medidas para eventos específicos em antecipação a uma
possível pandemia. Outros, especialmente no setor de alimentos, investem em
campanhas de marketing procurando atenuar possíveis receios relacionados ao
uso de seus produtos, protegendo com isso suas marcas em caso de pandemia.
Apesar do alto grau de incerteza em relação à evolução futura da gripe,
Kunreuther, da Wharton, observa que resta às empresas apenas uma opção:
planejar. “Somos todos míopes.
.
Temos
dificuldade em pensar sobre o futuro a longo prazo. É difícil tomar medidas
hoje cujo retorno só veremos muito à frente. Isto significa que todos nós,
como indivíduos e organizações, temos de repensar o que apelidei de
filosofia da próxima gestão — isto é, deixo meus problemas para o meu
sucessor resolver. Esse tipo de comportamento dificulta muito o planejamento
de longo prazo nas empresas.
Kunreuther acrescenta, porém, que a preparação para uma possível pandemia
deveria ser apenas um dos componentes de uma estratégia mais geral de gestão
de risco.
.
Meu questionamento diz
respeito não apenas ao modo como as empresas pretendem se preparar para a
gripe aviária. Gostaria de saber também que medidas elas poderiam tomar que
redundassem em outros preparativos igualmente benéficos em relação a riscos
diversos, observa. O planejamento para uma possível pandemia deve também
concorrer para o bem-estar da empresa nos mais diferentes níveis. Penso do
mesmo modo no que diz respeito aos planos de combate ao terrorismo e em
casos de desastres naturais.
.
Gary Lynch, líder de práticas para gestão da continuidade dos negócios nos
EUA da Marsh, também pensa como Kunreuther. O número de consultas feitas por
clientes em potencial sobre estratégias de planejamento no caso de
disseminação da gripe, além de discussões com clientes da consultoria,
aumentaram significativamente no mês passado, disse Lynch, acrescentando que
o modo como as empresas reagem à possibilidade de uma pandemia pode ser
classificado de duas maneiras.
Há as que pretendem investir algum tempo
e dinheiro se preparando, mas no fundo elas acham que o temor de uma
possível pandemia não corresponde à realidade, e que o vírus será mais
um bug do milênio, um fenômeno de que tanto se falou e que custou
bilhões em planejamento, mas que não deu em nada.
Outras empresas, segundo
Lynch, optam por uma postura mais ponderada e holística. Elas tratam da
questão por um prisma que lhes permita aperfeiçoar todo e qualquer
procedimento referente a outros tipos de desastres.
Essas organizações analisam um
cenário de ameaças, acrescenta Lynch. Elas procuram não se concentrar em uma
ameaça apenas. Portanto, seja ela qual for, as conseqüências se fará sentir
em quatro vertentes:
pessoas, tecnologia e processamento,
contexto físico e suas respectivas relações.
Portanto, se as empresas puderem compreender as duas coisas que lhes
oferece sua estratégia atual de atenuação de risco e transferência, e em
que medida essa estratégia é capaz de protegê-las, e ainda: de que modo
será possível enquadrar aí outras ameaças saberão que ajustes fazer em
sua filosofia de gestão de risco.
O pensamento de
Kunreuther e Lynch pode ser ilustrado com o seguinte exemplo: Kobrin, da
Wharton, lembra-se de ouvir um executivo de uma companhia de serviços
financeiros contando aos participantes do Fórum Econômico Mundial que sua
empresa havia desenvolvido um software especial, em caso de pandemias, ele
permitiria a seus operadores executarem transações com valores mobiliários
em suas casas.
Lynch observa que se trata
sem dúvida alguma de uma medida positiva, mas que está longe de ser
suficiente. Ela não leva em conta o que tais operadores farão se o
fornecimento de energia e a infra-estrutura tecnológica Internet, linhas
telefônicas e a energia elétrica que abastece as casas e os apartamentos
entrarem em colapso durante uma pandemia em razão do afastamento dos
trabalhadores encarregados por motivo de saúde.
Quatro cenários de pandemia: -
No momento em que houver uma
vacina que previna o contágio de seres humanos pela cepa H5N1, diversas
questões espinhosas virão à tona, observa
Mark V. Pauly,
professor com PHD
em Sistemas de Saúde da Wharton.
É bem provável que o
aparecimento de uma vacina não nos imunize 100% contra o vírus.
Portanto, cabe aqui a
seguinte pergunta: não seria melhor que as empresas preparassem e
estocassem a vacina com antecedência, em vez de tentar organizar
estoques depois da irrupção da pandemia?
.
Uma outra pergunta: quem
deve ser vacinado? É óbvio que o pessoal de saúde e de resgate, entre
outros, deve receber prioritariamente a vacina. Contudo, em se tratando
do público em geral, é preciso levar em conta a ocultação de estoques e
o armazenamento indevido. Para evitar esse tipo de comportamento
predatório, é importante que haja um plano de ação.
Qual seria o impacto de uma pandemia hoje?: -
Fishman cita um
estudo de 1999 segundo o qual a evolução para pandemia da cepa atual de
gripe infectaria entre 43 e 100 milhões de pessoas, ou de 15% a 35% da
população dos EUA. Seriam necessários cuidados médicos para atender entre 18
e 42 milhões de americanos em suas casas. Entre 314.000 e 733.000 americanos
seriam hospitalizados, e de 89.000 a 207.000 morreriam. O ônus econômico
decorrente de problemas no setor de saúde foi estimado entre 71 bilhões a
166 bilhões de dólares.
.
Com relação ao impacto disso sobre os negócios, um estudo publicado em
fevereiro de 2006 pelo
Instituto Lowy
de Política Internacional, de Sydney, Austrália, mostra que as conseqüências
de uma pandemia seriam enormes e desastrosas. De acordo com o estudo, a
ocorrência de uma pandemia levaria a um declínio na força de trabalho em
diferentes graus e em diferentes países em razão do aumento da mortalidade e
do número de doentes; fazer negócios se tornaria mais caro; o consumidor
abriria mão de suas preferências no caso dos bens suscetíveis à
contaminação; o risco-país passaria por uma reavaliação conforme o humor dos
investidores diante da reação dos governos.
O estudo do Instituto Lowy,
Conseqüências macroeconômicas globais de uma pandemia de gripe, analisou
quatro cenários baseados na gravidade de uma possível pandemia. Foi
constatado que até mesmo uma pandemia leve (semelhante em escala à gripe
de 1968) ceifaria 1,4 milhão de vidas em todo o mundo e geraria
prejuízos de cerca de 0,8% do PIB (330 bilhões de dólares) na produção
econômica.
.
Um cenário bem mais
severo, definido pelos pesquisadores como mais grave em abrangência do
que a catástrofe de 1918, resultaria na morte de 142 milhões de
indivíduos em todo o mundo, bem como em um prejuízo de 4,4 trilhões, ou
de 12% do PIB. Nesse cenário mais rigoroso, algumas economias emergentes
encolheriam mais de 50%. (O relatório Lowy também analisa o possível
impacto de uma pandemia de escala “moderada”, como o da gripe asiática
de 1957, bem como um cenário mais drástico, como o da gripe de 1918).
John E. Calfee,
especialista do
AEI -
American Enterprise Institute
de Washington, é
estudioso da indústria farmacêutica e de políticas de saúde. Ele se diz
otimista, porém cauteloso em relação à possibilidade de que a pandemia não
ocorra. Um dos motivos que o levam a pensar assim é o fato de que a gripe
aviária já tem cerca de dez anos; todavia, não evoluiu a ponto de infectar
grandes contingentes de pessoas pelo contato individual. Calfee lembra
também as circunstâncias específicas da colossal irrupção anterior da gripe
(1918-1919) como motivo de esperança.
.
O surto de 1918 foi de uma virulência terrível, porém as condições em que se
deu sua disseminação foram bastante incomuns. A transmissão da doença ganhou
ímpeto nas trincheiras da 1ª Guerra Mundial, nos hospitais e nas instalações
militares em que os soldados viviam em condições pouco mais do que
precárias. Em outras palavras, diz Calfee, o vírus de 1918 teve muito mais
oportunidades de mutação no organismo humano.
Atualmente, nada impede
que o vírus da gripe aviária passe para o ser humano. O processo de
mutação tornará o vírus mais facilmente transmissível, porém o vírus em
si mesmo poderá se tornar menos letal. Isso porque um vírus se
transmite, em geral, por meio de pessoas infectadas, mas que não se
acham gravemente enfermas; afinal de contas, eles precisam circular para
interagir com as pessoas e então infectá-las.
.
Contudo, se enchermos os
hospitais ou as enfermarias militares de pessoas, aquelas que estiverem
muito doentes exporão outras ao vírus, observa Calfee. Com isso,
espalha-se um vírus letal. Mas as condições existentes hoje são muito
diferentes das que vigoravam durante a 1ª Guerra Mundial. Além disso,
muita gente morreu em 1918 por causa de infecções secundárias, como
pneumonia, por exemplo, que hoje têm tratamento.
Stephen Kobrin
-
Peter Cappelli
-
Robert E. Mittelstaedt
-
Howard Kunreuther
-
Neil Fishman
-
Mark V. Pauly
.
biblioteca exclusiva da univ.
wharton
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